“Eu é que sei que
pensamentos tenho a vosso respeito; pensamentos de paz e não de mal, para vos
dar o fim que desejais.” (Jr. 29:11)
Tenho medo. Tenho angústia. Tenho sono. Um sono que não é de
não dormir.. é um sono de não querer acordar. Meus planos fracassaram...
Ultimamente está muito difícil de querer acordar. Tudo lá
fora parece estar morto, triste, sem senso, sem rumo. Todos parecemos caminhar
para a morte. Como chegamos até aqui, nesse labirinto gigante que não sabemos
quantas saídas tem? Será que tem?
Outro dia ouvi uma
mensagem sobre esperança. Espera – intervalo. Esperança – fé (crença) no
futuro, confiança, virtude. Confiança – crédito, de boa fama, segurança e bom
conceito que inspiram as pessoas de probidade, talento, discrição, esperança firme,
familiaridade, atrevimento. Virtude – força moral, disposição firme e habitual
para a prática do bem, boa qualidade moral, eficácia, validade, motivo.
Hoje não tenho nada disso. Não tenho esperança, não tenho
confiança, não tenho virtude. Nada. Sinto-me seca, triste, fraca, incapaz. Não,
não foi de uma hora para outra. E não, não sou a única a me sentir assim. Essa sensação
de vazio vem se construindo em nossa sociedade há algum tempo, desde que
começaram a nos dizer que estávamos erradas em acreditar que precisamos cuidar
umas das outras. “A outra é sua concorrente, você precisa derrotá-la”. Fizeram-nos
acreditar.
Não digo que estou totalmente fora dessa lógica, mas luto, sempre
que me percebo nela, para fugir. Que tristeza saber que ela se enraizou de tal
forma que virou estilo de vida... que angústia não poder reverter essa
condição. Eis um intervalo dolorido na minha existência. Estou cansada de
correr pelos corredores desse labirinto que me levam a paredes sem portas.
Não creio no futuro a partir desse processo de destruição. Não
há como confiar na semelhante se encarada como concorrente a ser derrotada. No final
das contas, assassinato é suicídio. Não há virtude nessa prática.
Não há crédito nem boa fama para as vencedoras desse jogo
que não inspira segurança, pois não há quem aja com probidade. Não há talento no
desconsiderar a vida. Não há bondade em desejar a morte.
Hoje vejo tudo isso. Sinto tudo isso. Vivo tudo isso. Sinto-me
engasgada, angustiada, amordaçada, desesperançada.
Outro dia, ouvi uma mensagem sobre esperança. Uma mensagem
que falava de ressurreição. De vida, de projetos, de futuro...
Agora me esforço para me lembrar daquelas palavras. Não consigo.
Mas preciso. Desesperadamente, preciso. Sem voltar a acreditar na validade da
vida, não posso querer acordar. Não do sono, mas do querer dormir. E eu quero
dormir. Dormir para passar.
Me dou conta de que não me lembrarei das palavras
esperançosas se eu não trocar os meus óculos. Parece estranho, mas é verdade. As
lentes que uso agora estão refletindo morte, descrença completa. Pelas lentes
do niilismo, a vida é reduzida a nada. Quando foi que eu as coloquei???
Espere um momento... vou trocar. Volto já.
Pronto! Voltei. Achei minhas lentes do amor. Estavam guardadas
em uma gaveta desde a última vez em que me dei conta do quanto podemos ser cruéis
umas com as outras. Bom que ainda me servem. Ainda enxergo com elas.
Começo a me lembrar, aos poucos, da mensagem. Tinha duas
frases muito significativas: “Não chores.” e “Levanta-te!” Reescrevendo-as, um
sentimento lá no fundo do meu coração se acende. Sei lá, uma chama pequena que
me traz um calor suave e reconfortante. Me faz sentir viva!
Falava também de cuidado de uma com a outra, de conforto em
comunidade, de acolhimento e de confiança. Tinha algo de enxugar as lágrimas e,
juntas, restabelecer a vida e refazer os planos. Recalcular a rota.
E como é difícil o processo de recalcular a rota para procurar
a saída. Primeiro, precisamos perceber que estamos num labirinto, porque ele não
se coloca como tal, mas como 'a forma correta de viver'. Não o enxergamos se não questionamos
por que vivemos como vivemos. É preciso ter coragem para fazer esse
questionamento.
Segundo, é necessário incomodar-se com essa situação. Se a
resposta ao nosso questionamento for um conformismo com o estilo de vida que
levamos, não há por que querer sair.
Terceiro (mas não último), é preciso ter uma opção a tal
forma correta de agir que se nos apresenta. Sim, porque, sem uma rota alternativa,
não há como refazer os planos.
Para construir uma rota alternativa (uma estrada nova mesmo),
precisamos estabelecer relações de cuidado com a vida, enxugando as lágrimas
umas das outras. Não podemos impedi-las de cair, mas, passado um intervalo,
elas precisam ser enxutas para que a segurança e a confiança sejam
restabelecidas. Não é possível querer acordar se não nos sentimos seguras e
confiantes.
Uma vez seguras e confiantes umas nas outras,
afidadas, precisamos ser
ousadas e nos levantar para anunciar um futuro a ser construído a partir das
lentes do amor. Olhemos para a outra como uma companheira de caminhada,
valorizando a sua vida, os seus talentos, as suas virtudes e, juntas, construirmos
os planos de um futuro fora desse labirinto edificado sobre a morte da
irmã e do irmão.
Precisamos trabalhar nesses planos de reconstrução para que toda
a diversidade humana e da natureza estejam incluídas neles, tendo a vida como
prioridade. Que neles, a morte não seja o plano, mas a consequência natural do ciclo, contemplação da finitude da vida.
Outro dia, ouvi uma mensagem de esperança. Hoje, relembrando,
escrevi uma e venci a angústia. E você? Qual verbo vai conjugar com esperança?
Daniela Leão Siqueira
11/05/2020